O comunismo como metáfora do medo (Artigo de jornal)

Existem palavras que metem medo apenas ao serem pronunciadas. Comunismo é um desses termos que sugere a presença de um inimigo imaginário sempre à espreita. O termo se oferece para várias leituras. Karl Marx acreditava no socialismo científico e via a utopia do comunismo como resultado necessário do desenvolvimento contraditório do capitalismo de mercado. Sua tese cientificista escondia um forte elemento moral, a importância de se lutar contra a injustiça social. No século XX, o marxismo conheceu inflexões. Lenin e os bolcheviques acreditavam que as lutas a favor do comunismo deveriam passar pelo controle do aparelho estatal no território nacional. Este programa foi tentado em vários lugares: nos países do Leste europeu e naqueles africanos e asiáticos que se liberavam da dominação colonial europeia em meados do século XX. O caso mais importante foi o da China de Mao Tsé-Tung.

Na América Latina o medo do comunismo está ligado diretamente à “Guerra Fria” entre Estados Unidos e União Soviética. Os norte-americanos, temendo a influência soviética na região, desenvolveram forte propagando anticomunista para fortalecer suas estratégias geopolíticas e de segurança. O movimento conservador armado de 1964, no Brasil, seguiu esta orientação ideológica. Hoje, o fantasma continua vivo alimentando as narrativas bolsonaristas da extrema-direita e incrementadas no imaginário popular pela associação entre comunismo e demonização.

A interpretação do comunismo como metáfora do medo esconde interesses escusos do poder colonial: racismo, intolerância com os diferentes, desprezo pelo direito legítimo das pessoas de acessarem os bens comuns da cidadania. As experiências políticas do comunismo produziram modelos burocráticos, centralizados e autoritários. Mas deixaram um legado importante: a importância do planejamento estatal para organizar a vida social. Os países que estão conseguindo sair da crise são aqueles que estão sabendo articular o diálogo político entre ideologias diferentes — sem criar inimigos imaginários —, com planejamento público, políticas redistributivas e participação social.

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